Identidade 4x4

Com exceção daquele que representa a unicidade, o absoluto, toda manifestação no universo é dual, tudo tem dois pólos, iguais em natureza, mas expressos em diferentes graus de variação.

Quente e frio são gradações da temperatura, luz e escuridão são gradações da luminosidade, alto e baixo são gradações da altura, norte e sul são gradações de latitude, e assim para todo o resto, como o ruído e o silêncio, o rígido e o flexível, o ocidente e o oriente, a esquerda e a direita, o masculino e o feminino, o ódio e o amor, a matéria e o espírito. Pares opostos, complementares, de uma mesma essência, e separados por uma gradação.

Quando temos um dos pólos, temos também o outro em potencial. Os pólos, e suas gradações, na realidade são convenções tomadas a partir de um referencial. O que é quente para uns, para outros é frio. O que para uns é a esquerda, para outros é a direita. O que para uns é o norte, para outros é o sul. Um mesmo ponto pode representar os dois pólos, ao mesmo tempo.

O interessante é que podemos variar a gradação de tudo que é da mesma natureza. Portanto algo que é quente pode também esfriar, algo que é rígido pode se tornar flexível, alguém que odeia pode também amar. O que não podemos é transformar quente em alto, frio em luz, ou ódio em justiça. Navegar entre os pólos, portanto, não se trata de tirar coelhos da cartola, de transformar, mas apenas de graduar, de ajustar a sintonia.

Na visão da tradição milenar hermética, o Universo é simbolicamente representando por um triângulo. A base que nos sustenta sendo o mundo material, e os dois lados representando os mundos mentais e espirituais, que nos elevam em direção ao topo, ao ponto que une, à unicidade. Sendo assim, não é por acaso que o formato de pirâmide tenha sido utilizado para a construção de templos em dezenas de culturas e civilizações espalhadas ao redor da Terra.

Quanto aos pólos e suas gradações, no mundo material não existe certo ou errado. Depende do momento, da necessidade, e do seu correto uso. Por exemplo, o frio é bom para conservar alimentos, e o quente já é bom para cozinhá-los. A luz é boa para se trabalhar, mas a escuridão é melhor para descansarmos. Variam as gradações, mas todos os deslocamentos no mundo material acontecem na base do triângulo, são deslocamentos horizontais, no mesmo plano, sem hierarquias, sem melhor e pior.

Já quando estamos nos referindo a pólos e gradações nos mundos mentais e espirituais, qualquer variação pode nos levar mais para cima ou mais para baixo, mais para perto da unicidade, ou mais para perto do mundo material. Desta forma, o ódio, a desonestidade e a injustiça nos rebaixam, o amor, a honestidade, e a justiça nos elevam. Nestes mundos, os deslocamentos acontecem nos lados do triângulo, e por isso são deslocamentos verticais, entre planos distintos.

Assim como fora, também dentro de nós existem todas as dualidades. A caridade e o egoísmo. A vaidade e a humildade. A injustiça e a justiça. Convém a nós graduá-las, dominá-las, antes que sejamos dominadas por elas. Uma pessoa ativa não é aquela pessoa que não tem preguiça, mas sim é aquela pessoa que dominou a preguiça. Uma pessoa boa não é aquela que não possui maldade, mas sim é aquela que dominou a maldade. A condição humana, portanto, é uma eterna escolha consciente, entre o subir em direção àquilo que nos torna mais humanos, ou descer em direção ao que nos animaliza.

Enquanto que no mundo material, quanto mais matéria, mais somos puxados para “baixo”, nos mundos mentais e espirituais quanto mais virtudes, mais somos atraídos para cima. A virtude contagia, sendo influenciados e influenciando pelo exemplo. É por isso que temos uma responsabilidade social pelo que somos, pelo exemplo que damos. A melhor coisa que podemos fazer por aqueles que amamos, é crescermos como seres humanos.

Desta forma, o caminho do meio não é a justa medida entre dois pólos, mas sim elevar-se a um ponto mais alto. É colocar-se em um outro degrau, sem desejos por nenhum dos opostos. É, fundamentalmente, equilibrar-se internamente, harmonizando os dois pólos,  deixando de reagir às circunstâncias, e passando a criá-las. É, segundo Platão, ser corajoso, ou seja, ser aquele que não abre mão de si mesmo diante de qualquer circunstância.

A dualidade é algo natural, que sempre existiu, e sempre vai existir. Brigar contra ela é uma tremenda perda de tempo. Nenhuma estrada detém um bom automóvel 4x4, e nenhuma circunstância detém uma identidade clara e bem definida. Ela se impõe sobre as circunstâncias. Onde há uma vontade, há um caminho.

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