O alicerce do progresso

Diariamente somos inundados por notícias que nos levam a acreditar que o mundo é constituído por golpistas de toda a sorte, lobos escondidos debaixo das suas peles de cordeiro, apenas esperando o momento certo para nos prejudicarem. A esperteza humana rende fofocas, posts, reportagens, filmes, e até músicas, que não raro invertem papéis, atribuindo o ônus a quem “se deixou” enganar, e deixando um rastro de verdadeiros desorientados quando o assunto trata-se de confiança.

Com todos estes estímulos negativos é natural portanto que tenhamos medo em confiar. No âmbito pessoal, temos medo em nos decepcionarmos, e por isso estabelecemos relações superficiais demais. No trabalho, temos medo de falharmos, e por isso criamos empresas burocráticas demais. Na sociedade, temos medo de que nossas convicções estejam completamente equivocadas, e por isso expressamos comportamentos preconceituosos demais.

Desconfiar não somente nos limita, mas também exige da gente muito empenho. Para desconfiar é necessário esconder informações, dissimular impressões, desconversar assuntos, inventar desculpas, estabelecer conluios, sondar e vigiar a vida alheia, criar controles e regras, registrar acordos, justificar negações, julgar comportamentos, e mais uma série quase infinita de ações que consomem a nossa atenção, o nosso tempo, o nosso dinheiro, e até a nossa saúde. Desconfiar portanto não é uma ação simples, e não deveria ser a nossa primeira opção em nenhum tipo de relação.

Como os semelhantes se atraem, se a desconfiança nos protege, também ela não nos leva a lugar algum, a confiança, por outro lado, é um ponto de partida, que nos leva a colaborarmos uns com os outros, e a extrairmos o melhor de cada um de nós. Diferentemente do imaginário popular, a maioria das pessoas querem confiar, e, mais que isso, querem ser dignas de confiança, e, para a construção de uma visão de mundo melhor, precisamos apenas começar a mudança por nós mesmos, escolhendo confiar antes de desconfiar, atraindo aqueles que pensam da mesma forma.

É claro que não estamos aqui nos referindo a irmos de um extremo ao outro, passando a adotarmos uma confiança cega, ingênua, pueril a tudo e a todos, mas sim de avançarmos de forma consciente, gradativa, prudente e raciocinada, primeiramente construindo a base de valores que guiará as relações, e, a partir daí, se permitindo questionar verdades estabelecidas, e a experimentar e aceitar caminhos diferentes.

No âmbito empresarial, por exemplo, aprender a confiar pode significar a diferença entre prosperar ou sair do mercado. É sabido que os talentos buscam aqueles desafios que lhe possam prover autonomia, a busca da excelência, e o propósito, mas é impossível fazer isso em um ambiente desprovido de confiança. É necessário horizontalizar processos decisórios, apostar em programas de compartilhamento do conhecimento, e mostrar coerência naquilo que se fala com o que se faz.

As empresas, e não somente elas, podem escolher fazer diferente. Escolher delegar antes de centralizar, de entender antes de negar, de observar antes de legislar, de conhecer antes de julgar, de ousar antes de se acomodar, enfim, de confiar antes de desconfiar. Com a confiança, a criatividade flui livre de impeditivos, todos se esmeram em contribuir, e os desvios são corrigidos quando surgem. Algo totalmente diferente do que optarmos por aqueles caminhos já conhecidos e controlados, que não possuem desvios e, portanto, não exigem correções, mas também não nos trazem nenhum tipo de inovação.

Confiança não é uma fraqueza, mas sim uma fortaleza, é o alicerce de toda a colaboração, de toda a inovação, e de todo o progresso, e, como tal, precisa de experimentação, de estratégia, de paciência, e de sabedoria para crescer, florescer, e ser compartilhada, mas, acima de tudo, precisa de uma chance.

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